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quinta-feira, 28 de março de 2013

ÁGUAS DE MARÇO


Tradicionalmente no Brasil, com a chegada do mês de março chegam também as chuvas que anunciam o final do verão e a entrada no Outono. E tradicionalmente também, infelizmente, com essas chuvas vem os alagamentos, as enchentes, os deslizamentos de encostas, que assumem proporções de tragédia à medida que os centros urbanos crescem sem nenhum planejamento e sem nenhum controle por parte dos poderes públicos. Mais uma vez nesse ano, como vem acontecendo nos últimos anos, a região serrana do Rio de Janeiro foi assolada por uma enchente que deixou 13 mortos em Petrópolis em um único dia de chuva. É chover no molhado, com o perdão do trocadilho, apontar a irresponsabilidade dos poderes públicos municipais, estadual e Federal nesses casos. O poder público, que já não ordena a ocupação do solo, também não faze nada para, ao menos, remediar os danos causados anualmente pelas chuvas de março ou evitar que essas tragédias anunciadas continuem se repetindo a cada ano como uma tradição bizarra. A perda de centenas de vidas e a destruição de centros urbanos inteiros parece não ser suficiente para sensibilizar as nossas autoridades.

Mas, outro aspecto dessa situação me chama a atenção e me faz refletir. O caso é que, já também tradicionalmente, quando começam as chuvas de março, os meios de comunicação de massa colocam nas pautas dos seus telejornais reportagens a respeito de como se evitar os efeitos mais perigosos dos temporais. São dicas e conselhos que vão dos mais irrealizáveis como abandonar as moradias em área de risco (como se quem morasse em área de risco tivesse outro lugar onde se abrigar), até os mais simples como não jogar lixo nas ruas para que eles não entupam os bueiros e não causem alagamentos e enchentes. O que me chama a atenção é que essas reportagens, geralmente ilustradas com entrevistas com técnicos da Defesa Civil ou outras autoridades no assunto, jogam toda a responsabilidade de se evitar as enchentes em cima dos cidadãos, que são as principais vítimas dessas enchentes. Ou seja, se a sua rua enche e a lama invade a sua casa a culpa é só sua que jogou lixo na rua. Ou em cima de São Pedro que, coitado, não pode nem se defender. Tudo que pode fazer é mandar mais chuva como forma de protesto. Não se discute, nessas reportagens, a responsabilidades do poder público municipal na coleta do lixo que fica espalhado na rua, na realização de obras contra as chuvas (que devem ser realizadas antes do período de chuvas, é óbvio), no controle do uso e ocupação do solo, etc.

E não se discute, sobretudo, a responsabilidade do poder público em outra área que, a princípio pode não parecer, mas está diretamente relacionada a esse tema: na oferta de uma educação pública de qualidade. O fato é que os poderes públicos municipais, estaduais e Federal no Brasil vem sucateando a educação durante, pelo menos, cinco décadas. Primeiro, retirando dos currículos todos os conteúdos críticos, reduzindo a carga horária das aulas de história, geografia, sociologia, e fazendo uma educação cada vez mais técnica que não visava formar cidadãos e sim trabalhadores. Ou melhor, a formar “operários-padrão”, que produzissem bem e reclamassem pouco. E, mais recentemente, mantendo todo o sistema educacional em uma situação da mais extrema penúria de investimentos, onde falta de tudo: desde giz até professores. Esses últimos também deixados em situação de igual penúria, para a qual a única forma de protesto são as constantes greves que dão muito pouco, ou nenhum, resultado. No intuito de evitar a formação de cidadãos críticos e conscientes, que poderiam representar um perigo para os seus interesses, nossos políticos acabaram criando uma massa de semi-analfabetos e analfabetos funcionais que, apesar de passarem 9 a 10 anos na escola para concluir o ensino básico (os que concluem, é óbvio), não sabem sequer escrever na língua pátria. E que são incapazes de relacionar a enchente de hoje com o voto que colocou na urna em outubro passado. É preciso deixar claro, mais uma vez o meu ponto de vista: essas pessoas são vítimas e não culpadas. São vítimas do descaso do Estado em garantir os seus direitos mais básicos. Como o direito à educação gratuita e de qualidade. A questão é que, se as enchentes são causadas pelo lixo jogado na rua e o lixo na rua é causado pela falta de educação da população, então a responsabilidade pelas enchentes, e pelas tragédias que as seguem, continua sendo do Estado.

sexta-feira, 1 de março de 2013

RIO DE JANEIRO, 448 ANOS


Hoje, dia 1º de março é aniversário da minha cidade natal: o Rio de Janeiro. Todo carioca tem uma relação de amor com a cidade onde nasceu, cresceu e se criou. A mesma relação, creio eu, que os “cariocas postiços” também desenvolvem depois de algum tempo morando no Rio. A cidade é apaixonante, não se pode negar. Não apenas pelas suas belezas naturais, cantadas em verso e prosa, mas também (eu diria principalmente) pela sua cultura urbana. Pela relação que o habitante da cidade desenvolve cotidianamente com o espaço urbano no qual transita. Mas que, para o carioca, não é apenas lugar de passagem de um destino para outro. O carioca, natural ou postiço, adora estar no espaço urbano e participar da cultura que se constrói nesse espaço. A casa para ele é apenas local de descanso. E é curioso que continue sendo assim apesar de toda a violência que marca o espaço urbano do Rio de Janeiro há décadas. E, se a violência persiste, apesar de toda propaganda das UPPs, o carioca que ama a sua cidade também resiste a deixar de circular no espaço urbano.
Apesar de não morar mais no Rio há quase 4 anos, ainda visito frequentemente a cidade, a trabalho ou a passeio para visitar familiares. Ainda continuo muito ligado à cidade, como dá para perceber facilmente lendo as postagens desse blog. Dessa forma, se eu não moro mais no Rio, pelo menos posso afirmar que o Rio ainda mora em mim. Mas esse texto não é sobre o meu amor ao Rio (ou, pelo menos, não somente sobre isso). É sobre o aniversário da cidade. Uma curiosidade interessante a esse respeito é o fato de que hoje não é feriado no Rio. Como era de se esperar e como acontece em outras cidades. E talvez por isso, muitos cariocas não lembrem (ou mesmo não saibam) a data de aniversário da cidade. Muitos a confundem com o dia 20 de janeiro, dia de São Sebastião, padroeiro do Rio de Janeiro. Esse sim um dia de feriado. Sempre me perguntei pelo motivo dessa inversão, no mínimo, curiosa, para não dizer estranha. Mas nunca consegui encontrar uma resposta satisfatória (leia-se historicamente justificável). O fato é que hoje é dia útil no Rio. E será (já está sendo) um dia útil complicado, pois é o início de (mais) uma greve de ônibus. Pelo menos, nesse ano o aniversário da cidade caiu numa sexta-feira e quem quiser comemorar a data poderá esticar até mais tarde, depois do expediente, no bar da sua preferência. Hábito que já faz parte daquela cultura urbana carioca a qual eu me referi no parágrafo anterior.
Mas, assim como acontece com muitos de nós, que aproveitamos o dia do nosso aniversário não apenas para comemorarmos, mas também para refletir sobre a nossa vida, fazendo um balanço do ano que se encerra e alinhavando planos e projetos para os anos de vida que ainda estão por vir; o dia do aniversário da cidade também é uma boa oportunidade para refletirmos sobre a vida da cidade e, também, sobre a vida na cidade. Sobretudo, é uma boa oportunidade para nos perguntarmos se o Rio de Janeiro de hoje, esse que faz 448 aninhos de vida, ostentando títulos tais como os de Patrimônio da Humanidade e Cidade Olímpica, é o Rio de Janeiro no qual queremos viver. Se essa é a Cidade Maravilhosa da qual você tem orgulho de dizer que é natural e na qual você tem orgulho de viver.
Então, esse pequeno texto é apenas para sugerir que você aproveite essa data simbólica e, aí mesmo onde você estiver, de pé ou sentado, na chuva ou debaixo da marquise, reflita se essa é a cidade que você gostaria de morar. E, se não é, o que falta para que seja. E o que você pode fazer para que ela se torne. Aproveite que o ônibus vai demorar a aparecer (se aparecer), que você vai demorar para conseguir um espacinho para entrar  nos vagões lotados do metrô ou do trem e que o trânsito está engarrafado. É talvez seja melhor mesmo parar no bar.